30 de ago. de 2011

A graça não tem forma


Ouço muitos alunos dizerem que a falta de atividade física, a falta de flexibilidade e de força e, principalmente, a gordura e os quilinhos a mais são justificativas incontestáveis para as dificuldades que encontram ao fazer algum asana. Parece que os motivos são esses mesmos e que toda dificuldade se resume á esse aspecto, bastando então, fazer mais exercícios físicos. Mas não é apenas isso que esta em jogo, há uma outra coisa que não tem haver com o ter ou não condicionamento físico, com ter ou não o tamanho e a forma certa, ou melhor, a dita certa.
Essa coisa é o estar encarnado, estar presente e habitando todo o corpo, dos músculos até as entranhas, da pele aos ossos. Essa vivência de estar encarnado no próprio corpo exala graça, elegância e harmonia. Assim o corpo não é uma barreira a ser vencida, ou um ferro a ser malhado, e sim o meio de expressão de algo sutil e íntimo. Nosso corpo é nossa inserção no mundo, é nossa casa, nossa roupa, nosso veículo, nossa raiz, ele diz muito de nós, nos revela e nos cobre, nos prende e nos liberta. Nossos estados internos ganham realidade e poder quando podem aflorar pela maravilhosa capacidade do corpo de expressar as sutilezas do mundo afetivo. Que o diga um olhar apaixonado, ou um de ódio.
Neste fim de semana tive o privilégio de assistir a uma apresentação de dança clássica indiana. Emocionante, sutil, forte. Nada no corpo da bailarina é ignorado, dos dedos dos pés até as sobrancelhas, todo o corpo dança, ou melhor, se deixa dançar. A alma se revela e dança pelo corpo que é profundamente encarnado e, ao mesmo tempo, transcendido.
Quando assisti a esse vídeo de Acro yoga fui tocado de forma parecida, na verdade fui surpreendido ao reconhecer a graça e a leveza na praticante. Se o olhar for apenas para a forma dela, ela poderia ser chamada de “gordinha”, portanto quase uma coitada. Mas esse julgamento se torna sem sentido algum quando ela se expressa. A forma do corpo não limita o Ser. A forma é transformada e ganha graça, beleza e vida apenas quando se está profundamente no próprio corpo. Isso não tem nada haver com medidas, exercícios e a forma do corpo em si, tem haver com quem habita o corpo.


24 de ago. de 2011

o poder real


"Certa vez, o Buda foi ameaçado de morte por um bandido chamado Angulimal.
- Então tenha a bondade de realizar meu último desejo - disse o Buda.
- Corte o galho daquela árvore.
Um golpe de espada e pronto! 
- E agora? - perguntou o bandido.
- Ponha-o de volta - disse o Buda.
O bandido riu.
- Você deve ser maluco para pensar que alguém pode fazer isso.
- Pelo contrário, você é que é maluco, pensando que é poderoso porque pode ferir e destruir. Isso é tarefa para as crianças. Os poderosos sabem criar e curar."


22 de ago. de 2011

Para ler

"A árvore do yoga" de B.K.S. Iyengar, editora Globo. Neste livro o sr. Iyengar faz relações entre a prática do yoga e vários aspectos da vida, incluindo a saúde, família, etapas da vida, sociedade e uma interessante analogia entre as 8 etapas do yoga segundo Patanjali e uma árvore. Tenho um carinho especial por este livro, pois foi nele que visualizei e senti que a minha prática poderia ser bem mais profunda do que era, foi através deste livro que conheci o método Iyengar.



17 de ago. de 2011

Uma prática de yoga ou uma sessão de terapia?

Ontem a minha prática foi especial. Tenho feito uma mesma série de asanas há algum tempo, sempre os mesmos, na mesma ordem. Asanas que conheço já á vários anos, mas que vire e mexe me trazem boas surpresas. Ontem eles despertaram em mim sensações de segurança, determinação, lucidez e força, e numa conseqüência direta disso acabei resolvendo várias questões do meu dia a dia que estavam pendentes. Só percebi melhor esse efeito quando já estava resolvendo uma dessas pendências, essa por sinal já de alguns anos.
O que achei mais interessante foi a qualidade dos efeitos e a ressonância deles na minha vida além da prática em si. Os efeitos foram ganhando força no decorrer dos asanas e quando terminei estava sentindo-me muito bem, o que é bastante freqüente. Mas junto com as sensações mais corriqueiras de tranqüilidade, relaxamento, bem estar e energia, sentia também o gosto familiar de uma boa sessão de psicoterapia. Durante o processo psicoterápico podem ocorrer algumas sessões especiais, aquelas onde o inesperado surpreende o paciente e o terapeuta, onde algo se des-cobre e ganha vida, mudando definitivamente o caminho que estava sendo trilhado até então. Anos de terapia podem valer ou/e serem coroados por uma sessão com essa qualidade. Não se tem o controle de como ou quando despertar “isso”, parece até que “isso” tem vida própria, vem quando quer, ou pode vir, ou quer vir.
Saí ontem da minha prática/sessão sentindo-me confirmado, exato, livre, pisando no meu chão, certo do que precisava fazer e capaz de fazê-lo, algo havia se tornado mais simples para mim, algo havia se soltado. Sentia até a presença carinhosa do terapeuta, embora não me viesse à imagem de ninguém especificamente, que havia me apoiado e acompanhado nessa transformação.

15 de ago. de 2011

Yoga é filosofia


Num primeiro momento as posturas (asanas) do yoga podem parecer-se com uma atividade física ou com um tipo de exercício “zen”. Essa é a nossa referência cultural, o corpo é uma coisa, a mente é outra, as emoções são outra e o espírito, quanto reconhecido, é outra. Somos muito habilidosos em dividir e especializar as coisas do mundo e do ser humano em áreas específicas e distintas, mas nem todo saber é assim.
O yoga é uma filosofia prática que assume muitas formas, uma delas é o hatha yoga, o yoga que tem como ferramenta o corpo físico. Nesse yoga o corpo é transformado de maneira radical e profunda através dos asanas e pranayamas (posturas e respirações) que desenvolvem saúde, força, leveza, graça e longevidade. Mas esse trabalho corporal tem um alicerce filosófico que o sustenta e lhe dá sentido, sem o qual o hatha yoga pode virar uma malhação, das boas, mas apenas malhação. Além dos inumeráveis benefícios que trazem para o corpo e para a saúde, os asanas são principalmente um gancho para se conhecer e explorar a dimensão mental e seus padrões. O asana é a ponte que o hatha yoga utiliza para penetrar, aquietar e transcender a nossa instável e poderosa mente. E como faz isso? Focando a atenção no corpo e na percepção das sensações, despertando a atitude de observador, em outras palavras, levando o praticante a estar presente no corpo. Assim, a postura em si não é o mais importante, o que faz a diferença é a forma que é realizada e experimentada pelo praticante.
O asana acontece quando a filosofia Yoga se torna viva e real no corpo e na consciência do praticante. Nesse momento não há um corpo sendo malhado de um lado e uma mente perdida em pensamentos de outro, não há separação entre corpo e mente, entre filosofia e prática. Nesse momento não há nem mesmo um praticante, ali só há uma testemunha da experiência.

13 de ago. de 2011

Simples


"Ninguém jamais compreendeu


a beleza de uma flor


dissecando-lhes as pétalas"





Não se compreende a vida
dominando-a e dissecando-a
mas vivendo-a.

7 de ago. de 2011

O medo é um recuo



     Estou andando por uma rua silenciosa e arborizada após minhas práticas matinais. Ainda é cedo e o ar está fresco, o sol começa a aquecer o dia. Ando vagarosamente, sem presa, saboreando tudo que estou percebendo e sentindo. No meio desse estado de abertura e tranqüilidade sou surpreendido pelos latidos estridentes de um pequeno, e ruidoso, cão escondido atrás da brecha de um portão. Mais do que um susto, levei um choque. 

       Numa fração de segundo me encolhi, me defendi, saí do estado de abertura e de entrega que estava até então. Senti medo e recuei, imediata e involuntariamente. Essa reação não aconteceu apenas no meu corpo físico, que num salto se encolheu, ela foi ainda mais evidente em meu estado de espírito, em minha atitude interna, agora tensa e armada diante da ameaça sonora. Vi-me encolhido num gesto instintivo de proteção, fechando-me como as folhas da dormideira ao serem tocadas. Alguns passos adiante, respirando mais amplamente e observando o que havia acontecido comigo, fui me desarmando e voltando ao estado anterior de abertura e tranquilidade. Em instantes passei pelas experiências de estar aberto, ser “atacado”, sentir medo, me fechar, perceber minha reação defensiva e me abrir novamente.

     Um quarteirão adiante, já caminhando desarmado, me ocorreu que esse susto explicitou uma dupla fundamental de movimento em nossas vidas. Abrir e fechar, expandir e recuar, externalizar e internalizar. Vivemos nessas duas direções de fluxo, nesses dois movimentos básicos, sendo que, em um deles a energia vai para o mundo externo e no outro ela vai para o nosso mundo interno.

         Entre os vários motivos que podem nos levar para dentro há o sentimento de medo. O medo é uma emoção que nos fecha em nós mesmos, que desperta em nós uma atitude defensiva, um recuo diante da vida lá fora. No medo encolhemos os ombros, fechamos o peito, disparamos o coração, contraímos os músculos e congelamos o rosto e a respiração. Quando instalado, o medo pára em nós o pulsar da vida. Medo é o que sentimos diante de uma ameaça, ou daquilo que imaginamos ser uma ameaça. No medo encolhemos, ou avançamos atacando em desespero. No medo endurecemos, fingindo-nos de de morto, para não sermos mortos pela ameaça. No medo não vemos, escutamos, agimos ou pensamos com clareza e lucidez. No medo nos defendemos da nossa própria experiência.

         O contrário do estado de medo é a abertura, a entrega, a expansão. Se não há medo, os olhos podem enxergar, o rosto tem expressão e não se fecha, a respiração é calma, profunda e fluida, o peito é aberto e o corpo está pulsando, presente. Se não há medo é possível estar em relação íntima com o mundo, consigo mesmo e com o outro. Se não há medo o pensar se faz livre, o questionamento é possível. Se não há medo não há recuo, não há descompasso no fluxo das experiências. Se o medo não domina, a liberdade é possível, escolhas são possíveis, o diálogo é possível, a vida torna-se mais possível. Sem o medo a vida em nós pode expandir!

         Há várias formas de se lidar com o medo, entre elas abrir o corpo, ou seja, abrir os olhos (e enxergar), os ouvidos (e escutar), a boca (e dizer), os braços e as mãos (e fazer), as pernas (e sustentar e caminhar), o peito (e sentir e respirar). Podemos lidar com o medo abrindo a mente (e ousar pensar além dos padrões). Junto a tudo isso, teremos ainda melhores condições de lidar com o medo se tivermos a companhia de alguém presente e disponível conosco. 

          Lidar com o medo é deixar de recuar, é sair do encolhimento, é possibilitar a abertura e a expansão. No medo somos sempre menos do que realmente somos. Que mesmo com medo todos possamos lidar com nossos medos mais íntimos!  


3 de ago. de 2011

Quando o sono não vem


Dormir nada mais é do que um ato de entrega. Abandonar-se ao sono, aos lençóis, ao escuro, ao nada. Largar totalmente a mão do controle, da direção, pois para dormir, não há nada a ser feito, absolutamente nada. Quando não conseguimos esse "fazer nada", quando preenchemos o vazio do qual o sono brota naturalmente com alguma intenção, pensamento ou certas emoções, podemos receber a visita não muito agradável da insônia.

Ao contrário de ligar a tv, pegar um livro ou se levantar e ir fazer qualquer outra coisa, essa é uma ótima oportunidade para se praticar yoga. Com o quarto escuro e silencioso, experimente ficar deitado na cama com o corpo quieto, imóvel, e deixar a percepção passear pelas sensações do corpo e da respiração. Esse não é um exercício para se conseguir dormir, a única intenção é ficar percebendo as sensações que se tem, nada mais. Começe sentindo os pés, perceba quais sensações têm deles naquele momento, e depois vá passando cuidadosamente por cada parte do corpo, sem pressa, apenas percebendo e saboreando as sensações que tem de cada região. Durante esse percurso vários pensamentos virão pedir a sua atenção, e nessa hora é fundamental voltar-se apenas para as sensações e não alimentar os pensamentos. Ativar o racional nessa momento é afastar a entrega que pode levar ao sono, ficar nas sensações é uma forma de ir desligando a mente. 

Procure permanecer neste estado de observação despretensiosa, entregue à percepção das sensações corporais. Este é um estado profundamente restaurador e permite que o corpo e a mente descansem, independente do sono vir ou não. Não se importe e entregue-se ao corpo, você tem a noite toda para isso.

Para ficar do lado da cama


"Sono Tranquilo, programa completo mente/corpo para vencer a insônia", de Deepak Chopra, ed. Rocco. Neste livro o médico indiano faz um panorama do sono e da insônia, suas causas e seus tratamentos. Deepak Chopra é um famoso divulgador da milenar medicina indiana, o ayurveda. O livro traz noções básicas sobre a visão do ayurveda para o sono, a identificação dos 3 doshas (tipos) e indica uma série de cuidados a serem tomados para restabelecer o sono saudável. Simples e prático.