31 de mai. de 2013

Encontrando um bom guia



"Encontrei a vida - segredos da jornada interior", Swami Muktananda, Editora Vozes.

Neste livro, repleto de deliciosas histórias, Muktananda traça um valioso roteiro para os caminhos de desenvolvimento e despertar interior. Os capítulos descrevem as etapas e partes que compõem o sadhana, a prática de uma disciplina que leve à Consciência, ou ao estado do Ser, descrevendo de maneira simples e profunda questões sobre o ego, o Ser, o guru, a disciplina, Deus, amor e práticas. O final de cada capítulo é composto por respostas dele a várias indagações de alunos, por sinal, aquelas mesmas perguntas que fazemos durante os estudos e as práticas solitárias. Perguntas sobre o significado de conceitos filosóficos, hábitos de vida, alimentação, sexo, trabalho, relacionamento, religião, yoga, meditação, iluminação... 

Quando questionado sobre o sentimento de paz só ser possível quando nos afastamos do mundo social, Muktananda responde dando a direção que todo sadhana, toda busca de realização, deve ter:

"Faça com que a paz se torne inteiramente estabelecida em seu coração 
e leve-a de volta para o mundo"   

26 de mai. de 2013

Entrando e saindo de uma fria



Em dias mais frios me sinto melhor, mais disposto, e tenho a oportunidade de desfrutar melhor dos fantásticos efeitos do banho frio. Mas banho frio no inverno? Como assim? Bem, é isso mesmo, primeiro um banho quente e depois uma ducha final com o chuveiro desligado. O impacto do contraste das temperaturas faz milagres na fisiologia e traz um grande prazer. Só experimentando para saber. Apesar das muitas reticências que surgem imediatamente ao pensar nessa proposta, juro de pé junto que o banho frio vale muito à pena.

Recentemente acrescentou-se um algo a mais na minha experiência de banho frio, algo até mais valioso que o grande bem estar que ele sempre me trouxe. Há uns dias atrás, assim que desliguei o chuveiro e a água começou a esfriar, me percebi resistindo a ela, como se eu estivesse fugindo dela, apesar de estar ali por vontade própria. Parecia que eu estava recuando para dentro da pele, me afastando assim da água fria. Perceber isso foi interessante, pois me vi dividido em dois, um Marcos querendo o banho frio e outro Marcos se recusando a ele. Um lado não estava entregue, não estava de fato ali na experiência de sentir a água fria, talvez quisesse continuar com a água quente, ou talvez, nem quisesse ter saindo da cama tão cedo, não sei. Mas sei que ter percebido essa divisão me fez entrar de corpo e alma no banho frio, não mais resisti, deixei a água molhar e gelar a pele e a alma não foi para outro lugar, ficou ali mesmo.

Talvez a água gelada tenha intensificado a minha divisão interna, mas ela já me é familiar, não há nenhuma novidade nela. Estar em uma experiência e não estar presente, estar num local querendo estar em outro, fazer algo pensando em outra coisa, percebo isso acontecendo em mim muitas vezes durante o dia, às vezes de forma sutil e praticamente imperceptível. Antecipar ou relembrar pelo pensamento são forma de sairmos da experiência imediata e entrarmos num mundo paralelo ao aqui e agora. Meu corpo está em uma situação, mas o meu mundo interno, aquilo que considero como meu “eu”, está em outra situação, e muitas vezes totalmente desvinculada da experiência sensível do corpo naquele momento. Isso não é esquizofrenia, a conhecida e grave psicopatologia, mas possui a mesma dinâmica interna, a de se estar dividido e dissociado. Por sinal, o termo esquizo significa cisão, partido, assim como o estar conversando com alguém e na verdade estar mesmo é pensando no que fará quando se despedir dessa pessoa.

Perceber a minha resistência à água gelada me abriu para a experiência real da água fria, e é exatamente essa a proposta de muitas formas de meditação, abrir-se para a experiência real, direta, imediata, saindo da condição esquizo. Nada além, nada aquém, nada em outro lugar ou outro tempo. Tão simples e tão coerente, já que a vida só acontece aqui e agora no exato pulsar da experiência. E a nós cabe apenas escolher entre estarmos abertos ou fechados à isso.

19 de mai. de 2013

Disponibilidade é a chave

Estou retornando do III Encontro de Longevidade e Saúde, evento que ocorreu aqui em Taubaté e no qual participei dando práticas de meditação e pranayama. Foi um final de semana gostoso, intenso, produtivo e revelador. O encontro aconteceu num sítio muito bem cuidado e repleto de natureza. Comigo estavam também mais seis professores de yoga, tai chi, meditação, dança circular e educação física, e á toda essa ótima estrutura associou-se um grande tesouro: um grupo de quase 60 pessoas disponíveis!

Disponibilidade é uma chave que abre muitas portas, uma ponte que aproxima muitas margens. Ela é o grande lubrificante das relações humanas, da aprendizagem, das mudanças. Sem disponibilidade não existe professor, pois não existe espaço para troca, e nem existe o aluno, pois não há espaço para o novo. O professor alimenta-se da abertura do aluno em querer ir além de onde está, de seu mundo já conhecido. Se não houver disponibilidade no aluno em adentrar por novos territórios, resta ao professor pouco a fazer, no máximo um belo discurso (para ninguém). Por sua vez, se houver pouca disponibilidade no professor para estar próximo de seu aluno, para deixar-se tocar por ele, e assim, compreender seu mundo, pouco ele irá aprender, pouco ele irá além do que já conhece. Um professor que não é capaz de aprender é, no mínimo, uma grande contradição.

Sem disponibilidade a aprendizagem significativa, aquela que vale a pena, não pode acontecer. Sem disponibilidade não há transformação, não se sai do mundo já conhecido. Sem a presença da disponibilidade nenhum casal é possível, não há relação que sobreviva sem ela, e isso inclui o casal professor/aluno. Porém, quando ela está presente, a dança acontece e o casal se expande, vai além, se surpreende com o que é capaz de criar, e talvez até surja uma esclarecedora pergunta entre eles: mas afinal, quem ensina quem?

E é essa a minha constatação agora após o encontro, uma grande satisfação em ter trocado experiências e momentos com pessoas disponíveis, o que aumentou a minha capacidade de estar disponível. E disponibilidade é a terra fértil onde o yoga pode brotar e florescer.

                            Parte do grupo que se dispôs escalar o monte 

                               

8 de mai. de 2013

Tão bom que não quero





No meio do vai e vem e da agitação constante de uma academia de ginástica, aparece uma aluna nova. Chega falante, querendo malhar, querendo queimar, querendo extrapolar. Faz a aula e vai aos poucos mudando a freqüência. No final está com a fisionomia serena e com um leve sorriso no rosto. Ao perguntar-lhe como estava sentindo-se responde um convincente: “estou muito bem”.

Essa aluna some. Depois de quase um mês a encontro no corredor da mesma agitada academia. No meio do constante vai e vem de alunos, todos correndo atrás de novas modalidades de fitness, tivemos uma breve e significativa conversa:

- Como você está?

- Tudo ótimo!        

- Eu amei a aula, me senti muito bem, tão bem que me estranhei. Em casa eu nem xinguei a empregada. No serviço várias pessoas falaram que estava mais tranquila, sem ficar implicando e brigando com eles. Achei isso meio esquisito e acho que não posso ficar assim, acho que a aula acabou fazendo mal para mim. Não posso ficar de boa, senão o que vai acontecer comigo?

Um instante de silêncio e um ponto final: “mas eu gostei muito viu, um dia eu apareço”. Nos despedimos rapidamente, pois uma nova aula de uma nova modalidade estava começando. No movimento da academia há sempre mais músicas, mais aparelhos, mais novas metas, mais novos alunos, há sempre um novo mais.

Na hora não consegui responder a sua pergunta, e nem sei se ela queria uma resposta, pois fiquei mesmo é encantado com esse paradoxo que ela expressou tão bem: queria sentir-se bem e quando encontrou isso, estranhou-se e se afastou. Que maravilha o que ela disse! Não é esse o nosso paradoxo? Transpor resistências, sair das distrações e suportar o que realmente importa. Não é esse um grande conflito do humano?

E usando esse caso apenas como gancho, não há como não pensar em algumas questões que podem ser reveladoras para todos nós (no lugar do ela coloque eu):  

O que será que a impediu de suportar a experiência de sentir-se bem?

O que a fez estranhar-se?

O que é esse estranhar-se?

O que ela não pôde abandonar?

Se ela ficasse desarmada o que aconteceria com ela?

Ela estava com medo do que?

Quem estava com medo?

O que estava resistindo?