Representação do anahata chakra, o centro energético do
coração dentro da fisiologia sutil do Tantra
Durante uma aula em que conduzia os alunos em posturas de
retroflexões (flexões do corpo para trás) uma aluna me perguntou qual era a
importância de abrir o peito, já que eu estava dando tanta ênfase a isso. De
imediato pensei: “ué, porque é bom!”, mas como isso não é resposta que se dê, fui
tentando responder para ela acabei organizando melhor o que acontece nessa, por vezes, intensa modalidade de asanas.
De imediato as retroflexões atuam diretamente na
flexibilidade da coluna, além de envolver as áreas do pescoço, ombros e tórax.
É nítida também a sensação de estimulação da circulação sanguínea. Esse intenso
trabalho muscular e articulatório cria mais espaço para os órgãos internos e
melhora a postura ao levar os ombros mais para trás e expandir a caixa
torácica. Mas essa é a faixa mais superficial de que acontece numa retroflexão,
pois um dos maiores e mais valiosos efeitos dessas posturas é sua ação direta na
respiração. Abrir o peito é uma condição para se poder respirar melhor, com
mais qualidade, mais amplitude e profundidade. O trabalho que se faz nas
posturas para trás vai abrindo esse caminho, vai abrindo portas e janelas num
corpo por vezes bloqueado e amarrado. Em quarto fechado é difícil entrar luz e
ar fresco. Mas a abertura não pára por aqui, ampliar a respiração não é um fim
em si mesmo, pois ela dá acesso a outras fronteiras mais internas.
Assim como a respiração se sustenta no bom funcionamento do
aparato físico e fisiológico para acontecer da maneira plena, as dinâmicas emocional e mental encontram também grande sustentação na qualidade respiratória. Ao abrirmos o peito e ampliarmos e aprofundarmos a respiração, criamos condições favoráveis
para o desabrochar natural de conteúdos emocionais. A atenção nas sensações
do corpo, a permanência na postura, a respiração consciente e o gradual avanço
em aberturas maiores garantem um contexto de proteção e confiança. É freqüente em
aulas de abertura do peito, ou de retroflexões, alguns alunos se emocionarem durante as permanências ou no final da prática. Geralmente dizem que a aula “mexeu” em alguma coisa por dentro, ou que ficaram mais
sensíveis, mas que estão saindo melhores, mais leves e mais acordados. Lembro-me
de uma aluna que teve, durante uma permanência mais longa em “setu bandha sarvangasana”, uma profunda e espontânea catarse em que reviveu,
chorando muito, um doloroso evento da infância. O que aconteceu para que isso viesse à tona? Há muitas variáveis pessoais envolvidas em uma situação como essa, mas a abertura do tórax e o
aprofundamento da respiração, aliados à consciência do que se está fazendo, aqui,
são fundamentais para se poder chegar, tocar e cuidar do coração guardado dentro do peito. Coração que não se resume em um músculo pulsante, mas que expressa um amplo e significativo universo emocional e pessoal. Com tudo aquilo que emerge desse contato com o coração, há apenas uma regra a seguir: aceitar e acolher, sem necessidade da análise
intelectual através de explicações e interpretações.
Asanas, principalmente as retroflexões, são terapêuticos por
si só, transformam nosso corpo, reorganizam nossas dinâmicas internas, abrem
canais e trazem vitalidade e saúde, em todos os níveis e sentido. Abrir o peito
nos asanas nos ajuda a abrir o coração para quem está conosco e impede, ou protela, pelo menos, de abrirmos nosso coração para um cardiologista.
B.K.S. Iyengar em setubandha sarvangasana
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