Estou um mês sem escrever nada para o blog, e não foi por
falta de vontade ou de ideias. Acabei entrando em um ritmo de trabalho que me
deixou pouco disponível para sentar, mastigar e produzir alguma coisa. Parece
que faltou tempo para entrar na sintonia necessária para poder escrever algo
sincero. Mas aqui estou eu, mais uma vez, escrevendo!
Nesse período de correria tive uma inusitada e misteriosa companheira:
uma aranha. Não vi como chegou e nem como se foi, mas ela ficou ali no canto da
janela da área de serviço por umas duas semanas. Quando criança tinha medo
delas e hoje sinto uma coisa meio desconfortável na presença das maiores. Essa
era do tamanho mediano, daquelas coloridas, com grandes bundas e pernas finas e
pretas que ficam em telhados de madeira. Inicialmente tive vontade de tirá-la
dali, afinal de contas ela era muito ousada em invadir a minha casa, mas ela
estava tão quieta que a deixei em paz, pois achei que seria um covarde se a atacasse.
Foram dias interessantes esses da estadia dela. A convivência
com aquela presença, não convidada e não bem vinda de início, foi aos poucos
mexendo comigo. Todo dia eu ia lá dar uma olhada, e lá estava ela, quase sempre
imóvel na teia ou então, ás vezes, refazendo a teia habilidosamente. Fui me
acostumando com a aranha e até disse para minha filha que agora tínhamos um
animal de estimação em casa. Ana Liz disse que ela não era muito fofa e acho
que tinha razão, mas fofa ou não, agora ela já tinha seu lugar garantido no
canto da janela.
Sem perceber acabei caindo na teia da aranha. Nesses dias
corridos que estava, e ainda estou, acabei tendo um sutil e interessante contraponto
com aquela aranha. Eu saía cedo de casa e chegava tarde, quando dava ia
correndo para almoçar e logo sair. Quando ficava em casa estava preparando algum
material ou revendo o que havia feito. Pouco tempo de conversa, de lazer e de ócio.
No meio dessa correria, quando ia tomar água ou comer alguma coisa, dava uma espiada
na aranha e lá estava ela, quieta, imóvel. Tinha a impressão de que ela fazia o
mínimo necessário para sobreviver, que contava com todos os recursos de que
precisava, de que não fazia nada a mais, de que não desperdiçava nada. Sua casa
ela própria fazia, sua comida dali mesmo viria, já sabia tudo o que tinha que
fazer. Enquanto isso, eu estava mergulhado numa correria (e bastante satisfeito
com a demanda maior de trabalho, sem nenhuma queixa), cheio de tarefas e
ocupações, várias assuntos em aberto, decisões a serem tomadas e às vezes um pouco
apreensivo. Parecia que a aranha gastava apenas a energia necessária para dar conta
de si mesma, e que na maior parte do tempo ela suportava serenamente existir,
como se, quando eu a via ali quieta, ela estivesse meditando. Enquanto o praticante
de yoga se debatia a aranha meditava, pensar nisso me fez muito bem.
De forma alguma gostaria de ser uma aranha, ou acho que deveríamos
viver como elas, mas o contraste foi esclarecedor. O encontro da minha correria com
a quietude da aranha na teia me trouxe essa pergunta: como um homem, ou mulher,
pode viver e dar vazão a toda espetacular complexidade, criatividade
e originalidade
que lhes são inatas sem perder o contato primordial com a teia da vida? Como
podemos integrar essas duas fundamentais dimensões do Ser?
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