2 de mai. de 2012

Quando fui olhado



      Foi por acaso, direi assim, que encontrei minha primeira professora de Yoga. Ela dava aulas na mesma rua, apenas dois quarteirões acima, onde meu pai teve uma livraria por muitos anos. Nessa época eu lia qualquer coisa que se relacionasse ao Yoga e à “filosofia oriental”, e me arriscava em algumas práticas de maneira inconsistente e confusa. Não imaginava que poderia achar uma professora de Yoga em Taubaté (em 1989), muito menos que poderia achar uma professora bastante experiente, e que ainda fosse minha vizinha. Pois bem, achei. Seu nome era Isabel Pardo Rossini, ou melhor, Dona Isabel, como era carinhosamente chamada por seus alunos.
       Fiz aulas com ela por uns três anos, até entrar na faculdade de psicologia. Com ela tive minhas primeiras lições sobre como praticar Yoga, as posturas, os respiratórios, os mantras, a meditação. Ela me apresentou ao vivo e na pele aquilo tudo que lia e via nos livros, mas que, por falta de orientação de um professor, acabava não passando de informações soltas e estéreis para mim. Mas o que mais me marcou nesse período com ela não foram as técnicas aprendidas ou novos conceitos filosóficos, que então pouco entendia. O que mais me marcou, e de fato me transformou, foi o estar com ela, apenas estar com ela.
      Certa vez, após uma aula, a procurei para conversar sobre alguma coisa da qual não me recordo. No meio dessa conversa houve uma pausa na minha fala e um inesperado e marcante instante de silêncio. Nessa pequena fração de tempo me deparei com seus impressionantes olhos azuis. Ela me olhava tranquila, e profundamente. Não haviam palavras, não havia distração, não havia nada mais. Pela primeira vez me percebi sendo olhado por outra presença, e me senti desconfortavelmente presente. Foi como se estivesse nu, sem nenhum esconderijo. Não que ela tivesse essa intenção, ela apenas estava ali, inteira e sem intenções, mas eu não. Pela primeira vez deparei-me com meu desconforto em estar assim tão próximo de alguém, e um pouco das minhas inseguranças e medos revelaram-se sem nenhuma cerimônia. Pelos olhos dela fui apresentado a um Marcos que até então não conhecia. Aos trancos juntei os cacos e retomei o assunto de qualquer forma, precisava me proteger novamente e voltei a falar. Felizmente já era tarde, as palavras já não vestiram o disfarce de meu personagem. Para o olhar, assim como para uma mente lúcida, só um instante é suficiente para que a verdade se desvele. Felizmente eu já tinha sido descoberto, já tinha me dado conta de que meu esconderijo não era tão eficiente quanto fantasiava. Já tinha percebido que fugia de mim mesmo.
    Não esqueço aquele encontro, aquele olhar, a intensidade daqueles segundos. Que sorte a minha ter sido encontrado pelo olhar de Dona Isabel. Jay Dona Isabel!


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