1 de fev. de 2012

A carne na mesa

Já faz alguns anos que não como nenhum tipo de carne. Essa foi uma decisão quase inevitável para mim, pois a carne nunca me caiu muito bem e não sinto a menor falta dela, pelo contrário, tenho até certa repulsa a ela. Além do gostar ou não gostar, há muitas outras questões que envolvem o comer ou não comer carne, tais como cuidados com a saúde e reflexões filosóficas, sociais e ambientais.
Mas há um pequeno detalhe em não comer carne que me intriga e já me faz pensar bastante. Por que algumas pessoas se incomodam com isso? Por que às vezes não comer carne parece uma afronta a quem come, por que essa decisão gera tanto questionamento? Nunca fiz propaganda nem panfletagem sobre ser vegetariano, nem qualquer tipo de crítica sobre o que o outro come ou deixar de comer, mas quando não como, ou quando falam que sou vegetariano, quase sempre ouço alguns mesmos comentários.
Não sei os motivos particulares dos que se incomodam com isso, mas há um simbolismo no comer que faz sentido para mim. Quando nos reunimos para uma refeição há algo mais importante acontecendo do que o apenas matar a fome. Falo isso partindo da minha experiência de descendente de italiano, onde a mesa cheia é o centro de tudo. Comer junto é compartilhar o mesmo alimento, é dividir a mesma fonte que vai nos estruturar, que vai nos constituir. Nada mais óbvio: tornamos-nos aquilo que comemos, meu corpo será amanhã o que como hoje. Quando não compartilho um alimento que vários comem, estou recusando me tornar aquele alimento, estou recusando me tornar igual. Realmente isso pode ser uma afronta para alguns. É algo parecido com o uso de drogas em grupo, é uma verdadeira auto-exclusão dizer não para o que está sendo compartilhado, seja álcool, maconha, cocaína, ou qualquer outra coisa.
 No dia-a-dia prefiro continuar a passar despercebido em não comer carne, acho até dispensável o rótulo vegetariano, haja vista que ele mais gera separação do que aproximação.

2 comentários:

  1. Acho muito justo seu comentário. É verdade que, ao dizer: "Eu não como carne." gera muita coisa no outro, o que chega até à surpreender. No entanto, acho também que o aspecto cultural tem um impacto muito forte na maneira como as pessoas veêm o alimento e no caso, a carne. Senti isso na pele aqui, depois de vir morar na França. O pensamento do francês é outro e isso é real e verdadeiro para os alimentos e sobretudo, a carne. Aqui, restaurante vegetariano é raridade - o que reflete bem o gosto do francês pela carne. Nao comê-la chega "quase" à ser um desrespeito ao alimento. No entanto, uma vez o animal morto, come-se até o cerébro. Falta de respeito é matar o bicho e não aproveitar tudo o que ele tem. Na culinária francesa, você encontra pratos com tudo, mas tudo mesmo do animal. Comer carne é tão normal que ninguém nem lembra que existe vegetariano, porém, com o problema real - e mundial - que o consumo de carne está gerando, tenho visto "um novo olhar" para os legumes, frutas e "afins" ; mesmo legumes antigos estão voltando à mesa do consumidor - ainda que devagar. Acho que comer carne hoje é uma responsabilidade com o planeta: a produção massiva de carne gera uma forma de pensar grotesca em relação aos animais e o tratamento dos mesmos é desumano ao extremo. Eles passaram à ser coisas. Isso também vale para o leite e os ovos. O problema também não está apenas em matar o animal e consumir sua carne - vai mais longe. Há também a maneira como o animal é alimentado e a carne que colocamos no prato do dia-à-dia virou veneno - literalmente. E se não fosse o bastante, a produção de detritos animais (pois bem, esses animais tem que fazer o xixizinho e o cocôzinho deles diários, não é ?) é um dos maiores problemas sanitários atuais, embora se fale pouco disso. Muito pouco, infelizmente. Acho que comer ou não comer carne é uma decisão pessoal, no entanto, atualmente o fato de continuar comendo carne e sobretudo, a maneira como comemos carne exige uma reflexão. Nao se trata do indivíduo que após um dia de trabalho duro come um bife em sua refeiçao ou do sujeito que, por morar em lugares extremos do planeta (Groenlância, por exemplo) nao têm outyro recurso que comer carne mas de uma banalizaçao completa do alimento e da vida animal, pois o animal passou à ser visto como um objeto e o perigo disso, é sobretudo a banalizaçao da vida num Todo. E a vida somos nós.

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    1. Oi Veruscka, que legal o seu comentário.
      Nos dias de hoje comer ou não comer carne envolve uma questão bem maior do que um prato pessoal, pois a produção da carne em escala industrial tem um preço bem alto para o planeta, sem contar é lógico com a desconsideração total pela vida animal. A industria da carne é mais uma expressão da nossa banalização da vida e do milagre de estarmos conectados.
      Abração

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