13 de jun. de 2014

A fala e os pés no chão

Fala certeira, pés no chão

Recentemente escrevi sobre como as posturas do yoga realizadas em pé trazem rapidamente a sensação de se estar com os pés firmes no chão. Pés firmes no sentido de se estar presente, atento, disponível para a vida, e não desconectado e perdido no próprio labirinto mental. Pés enraizados na realidade imediata, numa sensação geral de grounding com a vida.

Essa é uma clara constatação de se praticar as posturas corporais do yoga, mas esse efeito não é exclusividade do yoga. Várias são as formas de trabalho corporal que também proporcionam essa sensação. Há os caminhos mais tradicionais ou os mais contemporâneos, assim como aqueles mais próximos ou da arte, da religião, da ciência, do lazer ou do esporte, ou ainda aqueles que integram um pouco de cada um desses diferentes aspectos. Há também os realizados individualmente e os em grupo. Muitas são as vias de acesso à consciência.

Há também a forma não corporal de se ter os pés firmes no chão da realidade imediata. Há o grounding pela fala. Mas não de qualquer fala, me refiro aqui a aquela fala significativa que toca na estrutura mental e emocional de quem a escuta, e que em algum nível e de alguma forma, a desestrutura. Essa é a fala que por instantes nos joga no vácuo, na estranha sensação de perder o chão. Escutar aquilo que não era esperado e nem considerado, escutar aquilo que não se percebia e que não se sabia sobre si mesmo. Essa fala é no primeiro momento uma verdadeira rasteira em nossas identificações, ou seja, não oferece nem um pouco de grounding. Mas é justamente ela que nos irá permitir encontrar, na clareira que abriu, um novo chão para pisar e aterrar. Grounding pelo que foi escutado. Essa é a fala transformadora buscada e utilizada por todos os mestres, cuidadores, psicoterapeutas e terapeutas, não importando de que linhagem, tradição ou escola pertençam.  

Essa fala certeira e transformadora é uma moeda com dois lados, pois não é só quando escutamos que podemos ter os pés firmes no chão, quando falamos o que precisa ser dito também podemos ter grounding. É claro que às vezes sentimos primeiro os pés no vácuo ao pensarmos em como vamos dizer aquilo para tal pessoa, em o que o outro vai achar, em que repercussões nossa fala terá, e mais um monte de especulações mentais. Mas, superado o medo e pago o risco de falar o que tem que ser falado, nossos pés voltam-se a firmarem no chão e ficamos bem ancorados e aterrados em nossa clareza e posicionamento naquele momento. Grounding pelo que foi dito.
  
Uma fala é transformadora exatamente por ser diferente do nosso tão querido blá-blá-blá diário, pois nele raramente saímos do familiar, daquilo que já sabemos e que temos como certo. Falas que nos poem firmes no chão são falas que provocam e que acordam e não discursos sobre a verdade.

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