"Chui o projetista
sabia desenhar círculos mais perfeitos a mão livre
do que a compasso.
Seus dedos traziam formas espontâneas do nada.
Enquanto isso, a mente mantinha-se livre e
despreocupada com o que estava fazendo.
Nenhuma aplicação era necessária.
Sua mente era inteiramente simples
e não conhecia obstáculos.
Assim, quando o sapato se adapta,
esquece-se o pé,
quando o cinto se adapta,
o ventre é esquecido,
quando o coração está bom
o "pró" e o "contra" são esquecidos.
Nada de anseios, nada de compulsões,
nada de necessidades, nada de atrações.
Então seus assuntos
estão sob controle.
Você é um ser livre.
O calmo é certo.
Comece certo e você estará calmo.
Continue calmo e você estará certo.
A maneira correta de ir com calma
é esquecer da maneira correta
e esquecer-se de que a ida é fácil."
Chuang Tzu
22 de jun. de 2012
20 de jun. de 2012
Para ler, reler e fluir...
“A via de Chuang Tzu”, Thomas Merton, Ed. Vozes. Carreguei este livro na bolsa em boa parte do ensino médio e da faculdade, estava sempre o folheando e relendo-o. Algumas coisas nele eram etéreas demais para mim, e ainda o são, mas algumas eram cristalinas, diretas, férteis, simples e reveladoras. Para mim este é um livro de cabeceira, para se ter sempre a mão, para ser tomado em doses homeopáticas por toda a vida. Thomas Merton foi um professor e monge cristão que trilhou e mergulhou nos caminhos da contemplação. Foi um dos pioneiros no diálogo ecumênico da igreja cristã com as religiões orientais, principalmente o budismo. Encontrou o filósofo/sábio chinês Chuang Tzu, se encantou por sua visão e fez uma coletânea pessoal de seus escritos, que resultou neste pequeno e precioso livro.
Chuang Tzu foi um grande mestre e divulgador do taoismo, viveu na China em torno de 300 a.C. Seus textos e poemas são ao mesmo tempo profundos, simples, geniais, irônicos e sutis. Em poucas e precisas pinceladas ele retrata um universo onde o homem só é pleno por estar no fluxo do Tao, como um rio, sem medo, sem divisões, sem conflitos.
13 de jun. de 2012
A conferência Rio+20 e o yoga
Começou hoje (13/06) no Rio de Janeiro a conferência mundial
da ONU sobre desenvolvimento sustentável, o Rio+20. Políticos, cientistas,
ambientalistas, empresários e autoridades de todo mundo se reunirão para pensar
e propor alternativas de desenvolvimento verde, ou seja, um caminho que destrua
menos a nós mesmos e a nossa casa, o planeta Terra. Essa é uma questão enorme e
complexa em todos os sentidos, uma verdadeira rede com nós e ligações de
escalas mundiais. Qualquer lado da rede que for puxado trará outros com ele.
Nada é certo, tudo precisa ser negociado, ampliado, pesado, considerado. A
própria torre de Babel contemporânea.
Mas nesse quase caos social, econômico, político e ecológico
que é pensar o futuro hoje, ouso dizer que há uma certeza simples e absoluta: é
necessário mudança. E com um detalhe, de pouco adianta se ela for parcial, local
ou temporária, essa mudança precisa ser ampla, global e permanente (talvez algo
mais próximo de uma utopia). É preciso mudar valores, já bastantes enraizados,
que temos sobre o que é viver bem. Valores geram ações concretas no mundo e em
nós mesmos, e o mundo, assim como a vida, é transformado efetivamente por
ações, não por intenções. E pensando na urgência dessas mudanças é que agrego o
yoga na conferencia Rio+20.
Não, não imagino que colocar os participantes em posturas,
ou recitando mantras, seja uma solução, embora isso pudesse ajudar bastante no
clima das reuniões. A mudança que precisamos, urgentemente, envolve bem mais
que isso e não depende apenas do que for decidido nesta ou em outras
conferências. Geralmente, a grande dificuldade de qualquer mudança é justamente
manter a mudança. Mesmo não sendo o dono de uma grande fábrica, ou um político
influente, ou um ambientalista, quase todos nós temos informações de sobra sobre
como podemos colaborar, sobre o que podemos de fato fazer para uma vida mais
sustentável. Mais do que ter acesso às informações, temos o poder de
realizá-las. É preciso praticar o que se sabe, é preciso confirmar em ações uma
intenção. Todo praticante de yoga dedicado, ou qualquer um envolvido com o auto
conhecimento, sabe que mudar padrões mentais ou comportamentais exige um
investimento. Querer mudar é um bom começo, mas só querer não basta, é preciso
agir. A mudança que precisamos só será coroada com ações sustentáveis.
Portanto, aja, e aja agora, onde você está.
Mas se a mudança nem sempre é fácil (pense em quantos seguem
uma dieta com sucesso) há uma luz que amplia muito esse processo: a
consciência. Ao pensar em ações mais verdes, é inevitável não se questionar sobre
a validade de muitos valores que temos como certos hoje. Pensar verde é mais do
que querer salvar o planeta (“coitado, ele precisa tanto da nossa ajuda...”) é
um excelente exercício de ampliar a consciência, é rever um jeito de viver. Um
jeito que coloca o homem soberano e independente de seu contexto maior, à parte
da criação constante e inacabada do universo. Pensar verde é questionar sobre o
que pensamos ser uma vida boa, o que é se dar bem, o que é realmente
necessário, o que é perene e importante, o que é saúde, o que vale a pena na
vida, o que é o melhor, não apenas para mim, mas para todos. A consciência
dessas questões nos conduz a determinados comportamentos mais verdes,
inevitavelmente, radicalmente e permanentemente. A questão ecológica não é só politicamente
correta, vai muito além disso, ela é A questão.
6 de jun. de 2012
A vida plena na postura do cadáver
Toda prática de Iyengar Yoga é fechada com uma postura
especial, o shavasana. Na aula fazemos
mantra e pranayamas, e principalmente, fazemos muitos asanas (posturas). Cada
um deles é feito, refeito, estudado, percebido, incorporado e nos leva mais para
dentro do corpo físico. Essa forma de praticar é exigente, profunda e rica em
efeitos físicos, emocionais e mentais, mesmo que não se tenha muita consciência
disso. Todo esse trabalho nos revira por dentro, fazendo uma verdadeira faxina
e reorganizando vários aspectos do nosso ser. Praticar asanas é um exercício da
vontade, da determinação, do esforço, de superação. Mas a prática não fica
completa sem a atitude oposta da que se tem com os asanas: a entrega.
Após muitos asanas, o asana final é sempre o shavasana. Nesta
postura ficamos deitados e totalmente imóveis por alguns minutos. Nada a fazer,
apenas se entregar ao chão e aquietar o corpo. Shava em sânscrito significa cadáver,
e esta é a postura do morto. Nome nada agradável para quem quer saúde,
vitalidade, força, consciência, para quem quer se sentir bem praticando yoga.
Mas essa é a sequencia do fluxo da vida, fazemos muitas coisas com empenho e
vontade, crescemos e lutamos, conquistamos o mundo, e depois, inevitavelmente,
morremos. No final só há a entrega total, o rio sempre volta ao mar. Isso pode
parecer negativo, deprimente, triste, mas há aqui algo extremamente libertador.
Em toda prática de yoga “treinamos” o morrer. Em toda
prática de yoga reproduzimos o fluxo da vida com nascimento, desenvolvimento e
morte. Vivemos isso todos os dias, em todos os momentos, só que nos protegemos
na perspectiva do tempo, quando pensamos que um dia, lá na frente, e só lá,
isso chegará até nós. Na prática de yoga o shavasana é mais do que uma
recompensa, é mais do que o merecido descanso, é o momento de assimilação de tudo
o que foi feito, é o momento de mergulhar em si mesmo, é o momento de se
recolher. O shavasana permite a entrega do corpo e da vontade, o abandono de
qualquer pretensão, de qualquer ação. E isso é profundamente gratificante e
repleto de sentido. O shavasana coroa todos os outros asanas, possibilitando a
dissolução do que achamos que é o nosso eu. Na postura do cadáver temos por
alguns instantes a experiência de não ser ninguém, de simplesmente estarmos ali
existindo, além do saber sobre quem somos.
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