Papa Francisco no mesmo barco
O Papa Francisco tem na sua simplicidade e disponibilidade um
poder realmente extraordinário. Apesar
de carregar nas costas uma enorme, ampla e complexa tradição de dois mil anos,
ele age com a leveza de um simpático senhor indo comprar pão alegremente na
padaria da esquina. Não que ele não exerça sua sacra missão de guia espiritual,
daquele que interfere no mundo e na vida de milhões e milhões de pessoas. E não
também que ele não saiba que é um líder e agente político e social em escala
mundial. O Papa assume todos estes grandes encargos, mas ao mesmo tempo parece
dizer: “não levem tudo isso tão a sério!”.
Percebo e sinto ele dizendo isso através de seus gestos
espontâneos de sorrir, de cumprimentar a todos, de ser informal, simples e
acessível, de não fazer distinções. Percebo isso a começar pelo nome que
escolheu para si, ao cumprimentar o motorista, ao quebrar protocolos e em vários
outros pequenos gestos que não o deixam diferir de nenhuma outra pessoa. Esse “não
levem tudo isso tão a sério” não tem nada haver com desconsideração, falta de
fé ou banalidade, pelo contrário, sinto que é pela real consideração, fé e importância
que dá a todos à sua volta. “Venham, não levem tudo tão a sério, não fiquem aí parados
pensando e protelando, há lugar para todos, todos podem, venham!”, sinto ele dizer
isso sorrindo. E pelas reações que vi na sua visita pelo Brasil, não sou só eu
que sinto isso, parece que muitos foram felizes aos seus braços.
Não quero aqui falar de religião, nem de moral e nem de política.
Não tenho nenhuma pretensão de questionar ou apoiar o Papa e a doutrina teológica
da Igreja. Estou falando apenas que a atitude franciscana do Papa Francisco fala
mais, e vai bem além de pregações, discussões e propostas de salvação. O que me
toca nele é mais o que ele não diz, é sua intenção cativante e sincera. Seus gestos,
por serem pessoais, tocam pessoas, e isso é mais do que uma ideia, é mais do
que o poder de uma autoridade. Pensando melhor, acho que seus gestos, por serem
pessoais e simples, são mesmos é manifestações políticas, morais e religiosas,
diria até quase revolucionários em nossos virtuais dias.
O “não levem tudo isso tão á serio” é na verdade um belo lema
de desapego, de desprendimento. Não leve tão a sério suas pretensões, seus
medos, suas seguranças, suas conquistas, suas posses, suas certezas, suas dores, seu orgulho.
Desapegar-se é o coração de qualquer caminho espiritual, e não há nenhuma “verdade”
teórica e teológica que se sobreponha a essa profunda vivência. A vida pautada
no desapego produz frutos bem típicos, tais como leveza, profundidade,
coerência, compaixão, irmandade, inclusão, simplicidade. Lição dos Franciscos, do Vaticano e de Assis, e de
todos os santos, mestres e iluminados: não leve tudo isso tão a sério!